As empresas de Belo Horizonte enfrentam uma série de desafios específicos quando se trata de adequação à Norma Regulamentadora nº 10 (NR-10), que estabelece requisitos e condições mínimas para garantir a segurança de serviços com eletricidade. Como consultor que já auxiliou dezenas de empresas mineiras a se adequarem a esta norma, compartilho aqui os principais obstáculos e algumas soluções práticas para superá-los.
O cenário da NR-10 na capital mineira
Belo Horizonte possui um parque industrial diversificado e um setor de serviços em expansão. Da manufatura tradicional aos modernos data centers, praticamente todas as empresas lidam com instalações elétricas que precisam estar em conformidade com a NR-10.
Segundo dados da Superintendência Regional do Trabalho em Minas Gerais, cerca de 40% das empresas fiscalizadas em BH entre 2022 e 2024 apresentaram algum tipo de não conformidade relacionada à NR-10, um índice preocupante que demonstra a dimensão do problema.
“As fiscalizações têm se intensificado nos últimos anos, especialmente após acidentes graves envolvendo eletricidade na região metropolitana”, afirma João Paulo Mendes, auditor fiscal do trabalho. “Muitas empresas ainda encaram a NR-10 como mera burocracia, quando na verdade é uma questão fundamental de preservação da vida.”
Desafios específicos de Belo Horizonte
1. Edificações antigas e infraestrutura elétrica desatualizada
Um dos maiores problemas encontrados em Belo Horizonte é a quantidade de edificações comerciais e industriais construídas nas décadas de 70 e 80, quando as normas elétricas eram menos rigorosas. O centro comercial e bairros como Barro Preto, Lagoinha e áreas industriais do Barreiro possuem imóveis com instalações elétricas que não atendem aos padrões atuais.
“Reformar completamente um sistema elétrico em um prédio antigo pode custar até cinco vezes mais do que implementar o sistema desde o início em uma construção nova”, explica Márcia Oliveira, engenheira eletricista com 15 anos de experiência em adequações na região metropolitana de BH.
2. Rotatividade de profissionais qualificados
A escassez de profissionais devidamente capacitados em NR-10 é uma realidade em todo o Brasil, mas em Belo Horizonte o problema ganha um contorno especial devido à alta rotatividade desses profissionais.
“Formamos e certificamos colaboradores, investimos em sua capacitação, mas logo são atraídos por oportunidades em mineradoras da região ou em outras empresas que oferecem melhores salários”, relata Carlos Eduardo Passos, diretor de uma empresa de médio porte do setor metalúrgico.
Os cursos de NR-10 têm validade de dois anos, e muitas empresas se veem constantemente tendo que capacitar novos funcionários, o que gera custos recorrentes e períodos de vulnerabilidade durante as transições.
3. Condições climáticas específicas
As características climatológicas de Belo Horizonte, com temporais intensos na estação chuvosa e períodos de baixa umidade relativa do ar, impactam diretamente nas instalações elétricas e nos procedimentos de segurança.
“Durante o período chuvoso, entre outubro e março, registramos um aumento de 27% nas ocorrências envolvendo problemas elétricos”, aponta um levantamento do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais.
A instalação e manutenção de sistemas de proteção contra descargas atmosféricas (SPDA) se torna crucial neste contexto, algo que muitas empresas ainda negligenciam ou implementam de forma inadequada.
4. Cultura de segurança e resistência à mudança
A implementação efetiva da NR-10 exige mais que adequações técnicas – demanda uma mudança cultural que muitas vezes encontra resistência, especialmente em empresas tradicionais e familiares, bastante comuns em Belo Horizonte.
“Existe um choque geracional em muitas empresas. Eletricistas mais experientes que ‘sempre fizeram daquele jeito’ resistem à implementação de novos procedimentos de segurança”, observa Patrícia Lemos, consultora em segurança do trabalho.
Esta resistência se manifesta no uso incorreto ou na recusa em utilizar EPIs específicos, na execução de intervenções em instalações energizadas sem as devidas precauções, e na improvisação de soluções técnicas.
Soluções e caminhos para adequação
Diagnóstico realista e planejamento por etapas
O primeiro passo para qualquer empresa belo-horizontina é realizar um diagnóstico completo das instalações elétricas e dos procedimentos atuais. Com base nesse levantamento, é possível estabelecer um cronograma realista de adequação, priorizando os pontos críticos.
“Dividir o processo de adequação em fases viáveis do ponto de vista financeiro e operacional tem sido a estratégia mais bem-sucedida”, recomenda Felipe Drummond, consultor que já orientou mais de 50 empresas na região.
Parcerias com instituições de ensino
Uma alternativa para lidar com a escassez de profissionais qualificados é estabelecer parcerias com instituições como SENAI, CEFET-MG e escolas técnicas locais. Algumas empresas têm optado por programas de trainee e estágios supervisionados, formando profissionais alinhados à cultura de segurança da organização.
“Criamos um programa de formação continuada em parceria com uma instituição de ensino. Assim, temos um fluxo constante de profissionais qualificados e reduzimos a rotatividade”, compartilha Ana Cristina Ferreira, gerente de RH de uma indústria de médio porte.
Adaptações técnicas às condições locais
Empresas que têm obtido sucesso na adequação à NR-10 em Belo Horizonte desenvolveram soluções adaptadas às condições locais, como sistemas de drenagem especiais para instalações externas, considerando o regime de chuvas da cidade, e protocolos específicos para manutenção preventiva antes da temporada de tempestades.
“Antecipamos as manutenções preventivas para setembro, antes do período chuvoso. Essa simples mudança no cronograma reduziu em 80% nossas ocorrências elétricas emergenciais”, revela Roberto Almeida, coordenador de manutenção de uma rede de supermercados.
Formação de multiplicadores internos
Para enfrentar a resistência cultural, empresas bem-sucedidas têm investido na formação de multiplicadores – profissionais respeitados dentro da organização que são treinados não apenas nos aspectos técnicos, mas também em como sensibilizar e engajar seus colegas.
“Identificamos os líderes informais, aqueles profissionais que são referência para os demais, e os transformamos em embaixadores da segurança elétrica”, explica Luiza Campos, consultora em gestão de mudanças organizacionais.
Conclusão
A adequação à NR-10 em Belo Horizonte apresenta desafios próprios, desde a infraestrutura antiga até questões culturais e climáticas específicas. No entanto, com planejamento adequado, investimento em qualificação e uma abordagem gradual, é possível não apenas cumprir a norma, mas transformá-la em um diferencial competitivo.
Como bem resumiu o eletricista Sebastião Pereira, com 30 anos de profissão: “Antigamente achava que todo esse cuidado era exagero. Hoje, aos 58 anos, agradeço por ter uma empresa que leva a segurança a sério. Vi muitos colegas sofrerem acidentes que poderiam ter sido evitados.”
O caminho para a conformidade total pode ser desafiador, mas é certamente menos custoso que os riscos de negligenciar a segurança elétrica. Mais que uma exigência legal, a NR-10 representa a proteção ao bem mais valioso de qualquer organização: as pessoas que fazem parte dela.